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Vinte e sete memórias escritas a xisto.


Não fomos humildes quando definimos este objectivo. "Não queremos conhecer uma ou duas aldeias, queremos conhecer vinte e sete." As vinte e sete aldeias da Rota das Aldeias do Xisto. Se querem que seja sincera, nem sei muito bem quando (nem como) esta ideia surgiu, mas posso garantir-vos que foi antes de pisarmos o chão da primeira.

Entretanto, dois anos se passaram. E em dois anos descobrimos cada uma das vinte e sete aldeias...

Partimos para este fim-de-semana com vinte "checks" na nossa lista. Faltavam apenas sete, quatro mais acima, já perto da Serra da Estrela, e três mais centrais na zona de Pedrógão Grande. A dormida nas Casas com Estória, em Santa Comba Dão, era o ponto perfeito para a paragem entre estes dois planos distintos com muito em comum.

Mas, antes de vos falarmos nestas Casas com tanto para contar, falemos das aldeias.
Fajão não perdeu beleza com a chuva com que a conhecemos, apenas ganhou brilho. A chanfana e o queijo (com doce de gila) deram-lhe mais paladar. Só o íman a 8€ quebrou o encanto. Xiça, que é caro alimentar a colecção, por aqui...

Assim que entramos no Sobral de São Miguel, paramos o carro. Há uma vista panorâmica mesmo a pedir para ser fotografada. Um senhor diz-nos "Boa tarde!", mete conversa. Pergunta "Vieram ver a pobreza do Sobral?"... "Não diga isso, não diga isso..." "É verdade, é bonita esta terra, não é?". É, sim senhor. Tem um dos maiores aglomerados de xisto do país (é esta a sua riqueza), tem casas cuidadas, um rio e uma colina. E até arte urbana. É uma aldeia cheia de surpresas.

Vila Cova de Alva aparece-nos cuidada e mais branca. Aqui, as casas ganham entoação de palacete e o amarelo das folhas de Outono faz contraste com o negro dos troncos. Paramos para ouvir o som da chuva ao tocar nas folhas caídas no chão, que nos fez desligar o motor do carro. 

A Benfeita é tão bem feita que há uma árvore no leito do rio. A medição de forças entre as raízes e a água faz-nos pensar quem lá terá chegado primeiro - como a história do ovo e da galinha - mas é a Torre do Relógio, na colina, que nos faz perceber os sinais de que o fogo andou por ali. E, neste dia, as marcas do fogo foram uma constante. Ainda dói olhar.
E em Monte Frio, onde almoçámos, o contorno de tudo o que foi consumido pelas chamas ainda é muito negro, da mesma cor da placa que indica o nome da aldeia. Também ela foi consumida pelas chamas e ainda ali está, dois anos depois. 
Já tínhamos visitado esta zona depois dos incêndios de 2017 e foi um murro no estômago. Falámos sobre isto aqui e ainda recordamos o cheiro a queimado que veio para Lisboa connosco, dentro do carro. 

Voltemos à Benfeita. Foi a primeira vez que a visitámos mas já tínhamos andado por perto, já que é a aldeia mais próxima à Fraga da Pena. Aproveitámos a proximidade para lá dar um saltinho, que nunca é demais ver aquela cascata pujante de água. Foi daqui que seguimos para a Mata da Margaraça e depois, sim, até Monte Frio.

Descidos até à zona de Pedrógão, Mosteiro esperava por nós. A praia fluvial, apesar do tempo gelado, fez as honras da casa. E deu-nos a vontade de voltar. 

Dizer que uma aldeia pequena não tem nada para ver é pecado, para os lados do Casal de São Simão. A aldeia acontece toda à volta da mesma rua e talvez seja das mais adoráveis que vimos. Arranjada, limpa, com vida à séria. Rendas nas janelas, plantas nos canteiros e o inconfundível cheiro a lareira a sair das chaminés. Cruzamo-nos com duas cabrinhas acompanhadas do seu dono e não resistimos a uma fotografia. "Menina, não ponha isso no jornal, que o dono do arbusto que elas comem ainda me processa!" Combinado, senhor, não irá para o jornal!

Era já tarde quando chegamos, ao segundo dia de passeio, a Ferraria de São João. Tecnicamente, foi o final do nosso périplo pelas Aldeias do Xisto portuguesas. A vigésima sétima aldeia da rota. Mas sabemos que a aventura não termina aqui. Vê-la à luz dos seus candeeiros não foi suficiente. Esta aldeia respira e vive da sua comunidade. Há currais comunitários, um rebanho comunitário e até um sobreiral comunitário - que a salva dos incêndios há várias décadas. Queremos voltar e conhecer isto à luz do dia.

Ainda assim, não podemos deixar de sentir na pele o gosto da missão cumprida. Dissemo-lo no dia e repetimos: estamos infinitamente mais ricos e conhecemos melhor o nosso país. Estamos também mais gordos, porque a gastronomia das Aldeias do Xisto é maravilhosa. E mais apaixonados por este cantinho à beira mar plantado.

E vocês, quantas Aldeias do Xisto já conhecem?

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